As cozinhas ibero-americanas como eixo do desenvolvimento sustentável

As cozinhas ibero-americanas como eixo do desenvolvimento sustentável
Pichincha hornado (Ecuador). Foto del Ministerio de turismo de Ecuador

Já se perguntou alguma vez sobre todo o mundo cultural que há por trás do ato de cultivar, cozinhar e comer? Em como as cozinhas se relacionam com a natureza pela agricultura e os ingredientes e com a cultura pelas técnicas por trás das receitas? Em como, por trás disto, se encontram pessoas com histórias de hortas, mercados, fogões e mesas? Sabe sobre os empregos gerados e como as cozinhas incidem no turismo?

A resposta a estas e outras perguntas colocam as cozinhas ibero-americanas como ferramenta à mão e não totalmente explorada para a implementação de cada um dos 17 os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030.

Rosa Soto – Javier Enrique Godoy Fajardo – Chile

       O papel na Agenda 2030

A governança das políticas, programas e estratégias vinculadas com cozinhas como ferramentas de desenvolvimento sustentável permite explorar formas em que se pode pôr fim à pobreza (ODS 1), à desigualdade (ODS 10) em todas suas formas em todo o mundo (ODS 1), através da cadeia de valor da alimentação. Desde o campo, passando pelos mercados, até os lares.

De maneira mais específica, a Agenda 2030 se propõe pôr fim à fome, alcançar a segurança alimentar e a melhora da nutrição e promover a agricultura sustentável (ODS 2).

Nas cozinhas são definidos muitos dos indicadores de vida saudável e bem estar (ODS 3), para o qual a promoção de oportunidades de aprendizado durante toda a vida para todos, neste âmbito, é fundamental (ODS 4).

O aprendizado e consciência crítica de modalidades de consumo e produção sustentáveis (ODS 12) têm nas cozinhas uma plataforma de sensibilização, ao ser uma ação social cotidiana e que todas as pessoas realizam.

Pensar as cozinhas desde um enfoque de gênero (ODS 5) permite ampliar as oportunidades de justiça para cozinheiras tradicionais e de todas aquelas mulheres engajadas em diversos processos culinários.

Existe demasiada evidência de como conhecer as origens geográficas e históricas dos alimentos e sua traçabilidade intercultural permite falar da diversidade cultural, dos conflitos interculturais e do impacto das cozinhas naquilo que os países e as regiões chegaram a ser.

A cozinha é uma ferramenta única para se sentar, em uma mesma mesa, pessoas que não o fariam para debater ou construir soluções a conflitos, por esse motivo tem um papel fundamental na promoção de sociedades pacíficas e inclusivas (ODS 16).

As cozinhas são fundamentais para a identidade dos assentamentos humanos e das cidades (ODS 11), especialmente com relação ao sentido de pertinência vinculado com os sabores locais, compreendidos como a inclusão social, a resiliência e a segurança alimentar das cidades que estão vinculadas a elas.

“A cozinha é uma ferramenta única para construir soluções a conflitos, por esse motivo tem um papel fundamental na promoção de sociedades pacíficas e inclusivas”

      Desenvolvimento econômico e social

Que as cozinhas são uma fonte de crescimento econômico e de emprego produtivo não é algo novo. O desafio consiste em que as oportunidades econômicas sejam sustentáveis, inclusivas e responsáveis com o trabalho digno e o emprego produtivo (ODS 8).

Isto será fundamental para pensar na industrialização agroalimentar inclusiva e inovadora (ODS 9) que seja respeitosa com o meio ambiente.

Há muitos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que se relacionam com as cozinhas, como é o caso daqueles que abrangem a gestão sustentável da água e o saneamento (ODS 6), o uso de energia seguras, sustentáveis e seguras durante os processos culinários (ODS 7), assim como a conservação dos ecossistemas onde são gerados os ingredientes de nossas receitas, os oceanos, mares e recursos marinhos (ODS 14), a terra e os bosques, incluído o impacto da desertificação, a degradação das terras e a perda da diversidade biológica (ODS 15).

A adoção de medidas relacionadas com a soberania alimentar estará intrinsecamente vinculada com o combate à mudança climática, cujos efeitos estão impactando nos sistemas agrícolas, nas estações e na biodiversidade (ODS 13).

Cosecha de cacao – Juliana Carolina Bertone – Argentina

      Alianças

O espaço ibero-americano conta, desde 2014, com uma plataforma de cooperação regional chamada Ibercozinhas, cujo mandato é tecer alianças estratégicas para a salvaguarda, proteção e promoção das cozinhas ibero-americanas em suas dimensões de patrimônio e inovação.

Desde agosto de 2019, o Conselho Intergovernamental, integrado hoje pela Argentina, Chile, Colômbia, Equador, México, Panamá e Peru, decidiu apostar por uma implementação dos objetivos de desenvolvimento sustentável com enfoque de cozinhas.

Para isso, o Ibercozinhas busca impulsionar o projeto de políticas, programas, estratégias e iniciativas que abrangem quatro processos: conhecer as cozinhas, transformar as políticas, práticas e instituições, incidir com este conhecimento nas sociedades, e cooperar com atores e culturas tradicionalmente excluídos ou com potencial de sócios estratégicos.

Compreendemos que devemos conhecer nossas cozinhas ibero-americanas e nos propomos a sistematizar as boas práticas de metodologias de conceitualização e medição das cozinhas como patrimônio cultural e economia criativa.

É prioritário elaborar uma metodologia própria que permita a integração de diversas dimensões mais complexas, para contar com uma linha base para compreender as cozinhas como processos integrais. E, a partir desses conhecimentos, educar nessa complexidade das cozinhas Ibero-americanas.

No novo enfoque do Ibercozinhas, também estamos conscientizados de que esse conhecimento deve ser vinculado com políticas públicas integrais da cadeia de valor agroalimentar que promovam a economia criativa, a cultura gastronômica, a segurança e a soberania alimentares.

      Mapa das cozinhas ibero-americanas

Para transformar, o programa foi proposto desenvolver um mapa das Políticas Públicas da Cadeia de Valor Agroalimentar das Cozinhas dos países integrantes da iniciativa, como primeiro exercício a fim de avançar na compreensão das cozinhas para a implementação da Agenda 2030.

Este mapeamento permitirá reforçar as capacidades de formulação de ações específicas ao longo da cadeia de valor agroalimentar em nossos países e na Ibero-América.

Para cooperar, serão fortalecidas as alianças estratégicas com a finalidade de dar a conhecer, em uma primeira etapa, a diversidade das cozinhas ibero-americanas, em particular das cozinhas de povos indígenas, afro descendentes e migrantes.

Além disso, queremos engajar os ministérios de Relações Exteriores de nossos países para aprofundar no vínculo de nossas expressões culinárias com a projeção do país, a região e o estabelecimento de alianças estratégicas de cooperação através da denominada gastrodiplomacia.

Para incidir na sustentabilidade do Ibercozinhas como plataforma é imprescindível escutar as vozes múltiplas dos sabores e saberes locais e nacionais, mas desde uma rota que permita construir o regional com rigor científico, evidência cultural e responsabilidade social.

Para tanto projetaremos ferramentas comunicativas que permitam uma melhor coordenação e cooperação com outras instituições com missões vinculadas às cozinhas como, por exemplo, as que promovem o turismo sustentável da região.

O desafio é construir uma marca gastronômica ibero-americana desde um diálogo intercultural que nos identifique como espaço cultural diverso e inclusivo como nossas cozinhas mesmas.