A trajetória que reconhece os direitos dos povos indígenas a nível internacional não tem mais de 30 anos. Data de 1989, quando o Convênio sobre Povos Indígenas e tribais da OIT estabeleceu um marco legal que reconhece as comunidades originárias, uma instância que seria consolidada em 2007 com a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.
A nível regional, as medidas surgiram em 2016 com a Declaração Americana sobre Direitos dos Povos Indígenas e, no âmbito ibero-americano, com a Declaração Ibero-americana de Povos Indígenas e o Plano de Ação para a Implementação dos Direitos dos Povos Indígenas em 2018.
Apesar de, em todo este tempo, os governos locais terem feito esforços por traduzir este marco internacional a políticas públicas, existe a percepção no conjunto dos povos indígenas de que não foram suficientes para avançar em suas reivindicações.
Em termos gerais, os povos indígenas continuam sentindo os efeitos das injustiças históricas e a assimilação social, cultural, econômica e política.
Direitos plenos
Esta diferença na percepção motivou que, na Conferência Mundial sobre Povos Indígenas (2014), fosse solicitado aos Estados membros adotar medidas a nível nacional para concretar as metas da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.
Além disso, a Agenda 2030 para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável incorporou compromissos para implementar os direitos humanos, pôr fim à pobreza, lutar contra a desigualdade e a injustiça, e fazer frente à mudança climática, todos eles aspectos diretamente relacionados com os direitos dos povos indígenas.
“Fica muito caminho por avançar no reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, mas não pode se obviar o caminho já avançado”
Iniciativas ibero-americanas
Na Ibero-América, a questão indígena foi um dos pilares centrais a cooperação.
Como indicado na Declaração da XIII Cúpula Ibero-americana de Santa Cruz de la Sierra (Bolívia) de 2003, “a defesa dos direitos e a identidade própria das culturas originárias da América e afro descendentes deve ser uma prioridade permanente para nossos governos, porque contribuem de forma determinante ao desenvolvimento da identidade de toda a comunidade ibero-americana”.
Os povos indígenas são parte fundamental de nossas sociedades interculturais e sua plena articulação nas mesmas é um objetivo comum. O espaço ibero-americano está construído desde uma identidade que tem uma visão histórica partilhada entre seus países membros, onde convivem distintas identidades étnicas e culturais.
Por sua parte, o Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e o Caribe (FILAC), em seus quase 27 anos de vida, se converteu em um ator chave na luta por dar visibilidade e reconhecimento aos direitos dos povos indígenas da América Latina.
Pode se dizer que este foi um dos resultados mais importantes que emergiram das Cúpulas Ibero-americanas, já que é o único organismo multilateral de cooperação internacional especializado na promoção do autodesenvolvimento e o reconhecimento dos direitos das comunidades originárias.
“Um enfoque nas capacidades leva ao reconhecimento mútuo de direitos e a formar relações horizontais, mais justas”
Estender pontes
Considera-se que a aproximação aos povos indígenas deve se dar desde a igualdade de todos como cidadãos e dialogando para construir entre todos a sociedade que queremos.
Há de se pensar nestas comunidades mais além de suas vulnerabilidades e focar em suas capacidades. Um enfoque nas vulnerabilidades convida a formar relações verticais, baseadas na ajuda unilateral; um enfoque nas capacidades leva ao reconhecimento mútuo de direitos e a formar relações horizontais, mais justas.
Nesta linha, no marco da XXVI Cúpula Ibero-americana de Chefes de Estado e de Governo de La Antigua (Guatemala) em abril de 2018 foi realizado o I Encontro de Altas Autoridades de Povos Indígenas para gerar um espaço de concertação entre governos e representantes dos povos indígenas.
Essa ação teve como resultado a aprovação do Plano de Ação para a Implementação dos Direitos dos Povos Indígenas, que promove objetivos comuns e uma programação coordenada entre as autoridades nacionais, as comunidades originárias e organismos regionais e globais.
Na mesma Cúpula Ibero-americana de 2018, os Chefes de Estado e de Governo decidiram impulsionar a criação do Instituto Ibero-americano de Línguas Indígenas (IIALI) para fomentar o uso, a conservação e o desenvolvimento das línguas indígenas da América Latina e o Caribe, assim como apoiar os povos indígenas e os Estados no exercício dos direitos culturais e linguísticos.
Hoje existe um amplo reconhecimento jurídico às comunidades originárias através de normas de obrigatório cumprimento, em especial as legislações vinculadas à qualidade dos direitos coletivos essenciais, assim como a possibilidade de se autodeterminar e conservar sua cultura.
Está claro que ainda há de se avançar muito no reconhecimento dos direitos dos povos indígenas da Ibero-América, mas não pode se obviar o que já foi conseguido nos últimos 30 anos.