Empresas com um terço de mulheres em cargos de decisão têm 25% mais chances de obter um desempenho financeiro superior em comparação às que mantêm estruturas predominantemente masculinas.
Na Ibero-América, os países mais bem classificados são Espanha e Portugal, enquanto os que ocupam as posições mais baixas são Argentina e Venezuela. Experiências de CEOs que abrem caminho para outras mulheres e promovem a diversidade produtiva.
A União Europeia exige que, em um ano, a representação feminina alcance 40%.
Não se trata apenas de ocupar um lugar, mas de trabalhar para que outras também o ocupem. “Chegar é importante, mas também importa abrir caminho para que outras cheguem”, destaca Laura Barnator, Gerente Geral da Unilever Cone Sul (Argentina, Uruguai e Paraguai) e de Home Care América Latina, reconhecida como CEO do ano em 2022 e uma das executivas mais influentes da região. “O principal compromisso que nós, mulheres em posições de liderança, temos é construir representatividade para outras mulheres e diversidades a partir de nossos cargos, dando espaço para outras vozes com generosidade e sem egos. É preciso mostrar o caminho através do exemplo. Já estive em reuniões ou painéis onde só havia homens e perguntei por que não havia mais mulheres na mesa”, afirma.
As empresas com 30% de mulheres em posições de liderança têm 25% mais probabilidade de superar o desempenho financeiro em comparação com companhias dominadas por uma “sobredose de energia masculina”, segundo um relatório da McKinsey & Company de 2023, sobre 276 organizações dos Estados Unidos e do Canadá, que empregam dez milhões de pessoas. Os resultados da inclusão são evidentes. No entanto, as diferenças na Ibero-América persistem.
“Enquanto a União Europeia lidera com normativas como a Diretiva (UE) 2022/2381, que exige 40% de representação feminina nos conselhos de administração não executivos. Na Ibero-América, as medidas são, em sua maioria, voluntárias e limitadas ao setor público. Isso se reflete nos dados: Espanha e Portugal, com regulamentações mais robustas, apresentam os níveis mais altos de representação feminina em conselhos de administração, enquanto países como Venezuela e Argentina mostram uma participação inferior a 15%”, compara o relatório “Mulheres em órgãos de administração: análise de empresas cotadas ibero-americanas” (de próxima publicação), da Secretaria-Geral Ibero-Americana. (SEGIB).
As empresas com 30% de mulheres em posições de liderança têm 25% mais probabilidade de superar o desempenho financeiro em comparação com companhias dominadas por uma “sobredose de energia masculina”, segundo McKinsey & Company de 2023
As autoras/es da pesquisa, Monica Chao Janeiro, Elena Galante Marcos e Arturo Jiménez Rodriguez, avaliam: “Na Espanha, a representação feminina em cargos de liderança sênior é de 32,2%, e nos papéis de alta direção situa-se em torno de 25%. As cotas de gênero têm se mostrado uma ferramenta eficaz para promover a igualdade na liderança empresarial. Na Europa, países como Noruega e França implementaram políticas de cotas obrigatórias que aceleraram significativamente a inclusão feminina nos conselhos de administração. Além disso, setores como o tecnológico e o energético continuam sendo dominados por homens, o que destaca a necessidade de implementar políticas mais focadas nessas áreas-chave”.
A CEO da Unilever exemplifica: “É indispensável nutrir as organizações com mais mulheres, mas não apenas focar nisso, e sim incluir diversidades de todo tipo. Só assim se alcançam soluções criativas. A diversidade precisa ser acompanhada de uma verdadeira inclusão, caso contrário, fica restrita a indicadores”. E alerta: “A mudança de paradigma é possível a partir da ocupação dos espaços com responsabilidade, sem nos esquecermos de que ainda existem muitos mundos masculinizados e retrocessos em nível global nas agendas de gênero”.
“Eu decidi fazer a transição dentro da minha própria empresa”, conta a empreendedora de tecnologia argentina Eliana Bracciaforte, uma das líderes trans de referência na região. “Eu tive privilégios ao fazer transições, e a maioria do coletivo não está na minha situação porque há dívidas em termos de educação”, admite. “Mas é preciso garantir que mais mulheres e pessoas diversas liderem empresas”. “Tive um acolhimento incrível, mas contei com pessoas aliadas que me ajudaram incondicionalmente nos trâmites, seja para mudar meu nome no banco ou em um formulário. Eu não precisava lutar contra o sistema pessoalmente o tempo todo. Houve pessoas que assumiram isso como se fosse sua própria batalha – relembra – e isso me fez muito bem”.
“A Argentina tem uma boa Lei de Identidade de Gênero, mas, em um país como a Venezuela, que não é fácil, a empresa precisa adaptar o sistema”, diferencia Bracciaforte, Cofundadora da Workana e agora da No Pausa, ela é protagonista de uma história de vida que ensina a ampliar a visão e recomenda: “É preciso fazer de tudo para abandonar a prática de contratar amigos ou pessoas com quem estudaram na universidade. É necessário quebrar essa corrente. Mas isso implica assumir o custo de processos de contratação mais longos. A longo prazo, isso vale muito”.
“As empresas com maior representação feminina em seus conselhos de administração e equipes diretivas alcançam melhores resultados financeiros e se tornam mais competitivas”, destaca a pesquisa, que inclui dados do Fundo Monetário Internacional (FMI). A participação econômica das mulheres pode contribuir ao crescimento do PIB em 12% caso se consiga uma maior paridade nos cargos de liderança, segundo o relatório do Foro Econômico Mundial (WEF) de 2024. É importante continuar avançando e diminuir as diferenças norte-sul.
A União Europeia (UE) é líder global na implementação de cotas de gênero obrigatórias. “O impacto dessa normativa tem sido significativo, já que obriga as empresas a prestar contas e cumprir metas claras de representação de gênero. A Espanha, por meio da Lei Orgânica 2/2024, que regula a presença equilibrada de mulheres e homens nos conselhos de administração, estabeleceu uma cota mínima de 40%”, afirmam Chao Janeiro, Galante Marcos e Jiménez.
Mónica Chao destaca as virtudes das políticas de inclusão: “A diversidade de gênero impulsiona a inovação, com um incremento de 19% nos ingressos por inovação, segundo dados do Boston Consulting Group. A Espanha conseguiu fechar quase 80% de sua lacuna de gênero, posicionando-se entre os 10 primeiros países no nível global. A implementação de políticas de equidade, como as cotas de gênero e a igualdade salarial, gera sociedades mais justas, impulsionando a inovação, a competitividade e o bem-estar social”.
A participação econômica das mulheres pode contribuir ao crescimento do PIB em 12% caso se consiga uma maior paridade nos cargos de liderança, segundo o relatório do Foro Econômico Mundial (WEF) de 2024
Antes de 30 de junho de 2026, a Espanha deve cumprir com a normativa que exige 40% de representação feminina nos conselhos de administração. Os resultados são evidentes: a Espanha lidera o ranking de participação (39,5%), com Portugal (31,8%) em segundo lugar, enquanto Argentina (14,5%) e Venezuela (5,4%) ocupam os últimos lugares da lista. Entre os países estudados pela pesquisa da SEGIB estão: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Espanha, México, Peru, Portugal, Uruguai e Venezuela.
“Ainda na Argentina, apenas 5% das mulheres acessam espaços de decisão nas empresas, e na segregação do trabalho por gênero, continuamos tendo o maior percentual de participação nas profissões menos remuneradas”, destaca Barnator. E faz um chamado ao compromisso: “Cabe a nós, mulheres líderes, sustentar com consistência, superar as barreiras com argumentos e mostrar resultados concretos sobre o quão eficiente pode ser a diversidade de perspectivas para impulsionar o crescimento dos negócios”.
“Espanha e Portugal lideram a representação feminina nos conselhos de administração graças a normativas exigentes. Na América Latina, a Colômbia está à frente na representação feminina em conselhos de administração, com 27,3%, enquanto o Peru se destaca com 32,2% nos comitês de direção. No entanto, Venezuela e Argentina possuem apenas 5,4% e 14,5% de representação feminina nos conselhos, respectivamente, o que evidencia a necessidade de marcos regulatórios mais robustos”, analisa Chao. Já Elena Galante Marcos diferencia: “No setor público, há uma trajetória de aplicação de cotas nos países da América Latina analisados no estudo e, no entanto, essa medida não tem sido aplicada com a mesma prioridade no setor privado”.
Silvia Bulla, Presidente da Associação Cristã de Dirigentes de Empresas da Argentina, afirma: “Não deveriam existir dúvidas sobre o quão absolutamente favorável é contar com um board (conselho) diverso. Uma assembleia heterogênea, integrada por pessoas com diferentes habilidades, perspectivas, antecedentes e origens, promove a criatividade e a inovação, gerando vozes diversas que contribuem – de maneira colaborativa – para o cumprimento do propósito da empresa”. Bulla não se inclina pelas ações afirmativas e propõe: “As cotas são decisões que geram muita controvérsia. Minha experiência me leva a ser mais aberta, embora valorize as oportunidades que as cotas oferecem a mulheres talentosas que não estão visíveis. São opções para acelerar o status quo e avançar. O que fazer além disso? Manter um pipeline (diversas etapas de um processo) de candidatas, programas de desenvolvimento, coaching e mentorias. Garantir um ambiente respeitoso que promova a diversidade e o networking externo para oferecer aprendizado e contatos”.
A executiva global Rosaline Hester, mentora especializada em strategic human insights e transformações culturais de negócios, com 11 anos de experiência na sede da Coca-Cola no Rio de Janeiro, Brasil, afirma: “A diversidade nos conselhos de administração não implica apenas uma questão de equidade, mas uma vantagem estratégica. As mulheres trazem perspectivas diferentes que enriquecem a tomada de decisões e permitem respostas mais completas e inovadoras aos desafios empresariais”. Ela aprofunda: “No Brasil, as mulheres executivas têm demonstrado ser catalisadoras de mudanças, com uma profunda compreensão das necessidades humanas, que é um valor essencial para marcas mais conectadas com consumidores e comunidades, gerando resultados sustentáveis e relevantes”. Barnator conclui: “Estou convencida de que, para que outras mulheres possam sonhar com novos mundos possíveis, é fundamental dar visibilidade às histórias de mulheres líderes. E, principalmente, que isso não signifique renunciar a outras prioridades pessoais, assim como não deveria ser para ninguém”.